Análise da cobertura mediática colombiana sobre a covid-19: uma perspectiva das audiências

Este artigo acadêmico foi publicado na revista Comunicação, Mídia e Consumo  Vol. 21 No. 60, editada pela ESPM (Brasil). A versão em pdf inclui bibliografia, notas de rodapé e tabelas.

Análise da cobertura mediática colombiana sobre a covid-19: uma perspectiva das audiências

Introdução

No final de dezembro de 2019, os meios de comunicação mundiais informavam que as autoridades de saúde chinesas estavam investigando uma estranha pneumonia viral na cidade de Wuhan, província de Hubei, após terem identificado 27 casos relacionados ao vírus que causou a SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave), que em 2002 e 2003 resultou na morte de mais de 700 pessoas (REUTERS, 2019; AP, 2019). Um mês depois, em janeiro de 2020, com mais de 9.700 casos confirmados e outros 106 em 19 países, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou uma emergência de saúde pública de interesse internacional devido a um novo coronavírus inicialmente conhecido como 2019-nCoV e que havia sido identificado como a causa dos casos relatados na China (PAHO, 2020, p. 1; WHO, 2020a). Em fevereiro de 2020, a OMS nomeou a doença causada por esse patógeno como covid-19, coronavirus disease 2019, e o Comitê Internacional de Taxonomia de Vírus o batizou como SARS-CoV-2 (PAHO, 2020, p. 1).

À medida que as semanas passavam, os meios de comunicação noticiavam a sintomatologia e o comportamento dessa doença. Um vírus altamente contagioso, mas com uma baixa taxa de letalidade (CCDC, 2020), portanto, com capacidade de congestionar hospitais. Pode afetar homens e mulheres de qualquer idade e ser grave em pessoas com doenças preexistentes, bem como aqueles com mais de 60 anos têm maior probabilidade de morrer (CCDC, 2020). Nem todos os que ficam doentes mostram sintomas, os chamados assintomáticos (KINNEAR, 2020), e são considerados motores da transmissão (CONSALUD, 2020), podendo alguns deles morrer subitamente. Alguns sobreviventes podem ter uma recuperação lenta ou ficar com sequelas por um tempo indefinido (BELLUCK, 2020). Inicialmente, o SARS-CoV-2 foi considerado um vírus respiratório, por ser sua manifestação mais comum, mas com
o passar das semanas a conceituação mudou e ele passou a ser considerado multisistêmico, podendo atacar também rins, intestinos, vasos sanguíneos, cérebro, entre outros órgãos, produzindo, assim, uma variedade de sintomas (PUELLES et al., 2020; BBC, 2020).

Inicialmente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) resistiu em declarar o estado de pandemia, pois não a considerava incontrolável, além de poder assustar ainda mais o mundo, afetar as viagens, o comércio e estigmatizar aqueles que sofriam com ela, a pesar de que, em fevereiro de 2020, a presença do vírus tinha aumentado exponencialmente em outros países, como Itália, Irã e Coreia do Sul, evidenciando que ele circulava livremente em todos os continentes e se espalhava rapidamente (CARA, 2020). Em 11 de março daquele ano, a OMS anunciou que 118 mil casos em 114 países haviam sido detectados e 4.291 pessoas haviam morrido devido a essa doença. Diante dos alarmantes níveis de propagação, gravidade e inação, foi declarado o estado de pandemia (WHO, 2020b). Esse gerenciamento inicial da situação gerou questionamentos sobre o papel da OMS devido à falta de monitoramento, inação diante dos alertas, encobrimento e tratamento preferencial à China (COBOS, 2020, p. 37-38). Meses depois, tanto a OMS quanto a comunidade científica internacional reconheceram a possibilidade de que a covid-19 se tornasse uma doença endêmica devido às características dos coronavírus, reinfeções, imunidade adquirida, programas de vacinação e eficácia das vacinas (REUTERS, 2020a; SHAMAN; GALANTI, 2020). No início de 2023, a OMS continuava mantendo o estado máximo de alerta devido à pandemia da covid-19, que, embora a situação tenha melhorado nos últimos meses, causou 170 mil mortes e já superou em muito o número oficial de 6.804.491 mortos (DW, 2023).

A pandemia da covid-19 em território colombiano

Na Colômbia, o Ministério da Saúde e Proteção Social (2020a) relatou o primeiro caso de covid-19 no país em 6 de março de 2020, em uma mulher de 19 anos que havia chegado a Bogotá vinda da Itália. No
entanto, um estudo posterior da Universidad del Rosario et al. (2020) sugere que provavelmente o primeiro caso chegou à Colômbia vindo da França em 17 de fevereiro daquele ano. A primeira morte por covid-19 foi registrada em 16 de março de 2020 em Cartagena de Indias e foi de um homem de 58 anos com histórico de hipertensão e diabetes não tratadas, que havia sido infectado por dois turistas italianos que ele havia transportado em seu táxi dias antes (MINISTÉRIO DA SAÚDE E PROTEÇÃO SOCIAL, 2020b).

O governo da Colômbia, seguindo medidas semelhantes implementadas em outros países, através do Decreto 457 de 2020, ordenou quarentena obrigatória em todo o país, ou “isolamento preventivo
obrigatório”, a partir de 25 de março de 2020 (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2020a). No entanto, semanas antes, prefeitos de cidades como Cartagena de Indias e Bogotá já haviam implementado toques de recolher e medidas de isolamento social e confinamento devido aos casos detectados nessas cidades (ALCALDÍA DISTRITAL DE CARTAGENA DE INDIAS, 2020; LA REPÚBLICA, 2020). Em 31 de dezembro de 2020, a Colômbia registrava 1.642.775 casos confirmados, desses, 86.777 ativos, 43.213 óbitos e 1.508.419 recuperados, segundo dados oficiais (AS, 2020). O estado de emergência foi renovado sucessivamente ao longo de 2020, 2021 e início de 2022 sob os nomes de “isolamento preventivo obrigatório colaborativo e inteligente” e “isolamento seletivo com distanciamento individual responsável”, flexibilizando a cada prorrogação, em algumas regiões mais do que em outras, as restritivas medidas de isolamento social e mobilidade para reativar gradualmente os serviços, a indústria e o comércio. A última extensão foi feita pelo Decreto 655 de 2022, que o prorrogou até 30 de junho de 2022 (FUNCIÓN PÚBLICA, 2022), mas, dias antes de seu vencimento, a Presidência da República declarou que não havia razões sanitárias nem epidemiológicas para renovar novamente, encerrando assim esse período (LA REPÚBLICA, 2022).

Comunicação midiática em tempos de emergência sanitária

López (1986, p. 93) indica que os meios de comunicação coletam e distribuem 

informações referentes aos acontecimentos do ambiente da sociedade em particular e dos mais destacados a nível universal. Esta função permite aos membros de um grupo social orientar sua própria ação de acordo com a maneira como os eventos que ocorrem na sociedade são apresentados […] e este constante fluxo de informação […] tem consequências positivas: por exemplo, o fato de alertar a população sobre ameaças e perigos iminentes (furacões, ataques militares, epidemias etc.).

As notícias, portanto, são o produto jornalístico que permite realizar esse monitoramento ou supervisão do ambiente. As notícias são informações de interesse geral para um público-alvo e, portanto, os critérios de oportunidade, impacto, proximidade, controvérsia, proeminência, atualidade e estranheza (POTTER, 2006, p. 2-6), aos quais se podem adicionar novidade, desconhecimento e percepção de risco (GÓMEZ 2013, p. 41), determinam quais eventos ou acontecimentos serão divulgados nos meios de comunicação como tais.

A covid-19, que resultou em uma crise de saúde pública, cumpriu plenamente cada um desses critérios, levando assim os meios de comunicação “a fazer uma cobertura exaustiva na área da saúde, política, social, econômica e cultural, gerando uma agitação midiática de profunda repercussão na opinião pública devido à incerteza que representa” (COBOS, 2021, p. 116). Como Gómez (2013, p. 40) expressa, “se a sociedade sente medo diante de uma ameaça hipotética, os meios de comunicação se concentrarão nessa notícia, e as repercussões econômicas, de saúde, sociais e políticas serão notáveis”. Os primeiros relatos foram divulgados pelas agências AP e Reuters em 31 de dezembro de 2019, mencionando a situação em Wuhan e sua conexão com a SARS. Dado o histórico dessa doença, os meios de comunicação, incluindo naturalmente os da Colômbia, replicaram as informações e começaram uma ampla cobertura quando casos dessa pneumonia viral começaram a ser detectados em outros países (REUTERS, 2020b). Nos primeiros meses da pandemia, a covid-19 passou a ocupar o topo da agenda midiática com uma variedade de enfoques ou framings, especialmente quando foi detectada a chegada do vírus ao país, a primeira morte em Cartagena de Indias e as restritivas medidas de quarentena anunciadas pelo então presidente da República, Iván Duque.

Percepções da audiência, hábitos de consumo de notícias e a pandemia

Uma crise de saúde pública em escala mundial, como é uma pandemia, é, sem dúvida, um tema que capta a atenção da audiência e que, portanto, aumenta a demanda por notícias sobre os diferentes aspectos relacionados a ela: sintomas, expansão, estatísticas, medidas, afetações, impactos etc., particularmente nos primeiros momentos. 

A cobertura constante de eventos percebidos como negativos, como é o caso de uma pandemia, dispara o consumo de notícias ? impulsionado pela necessidade de estar informado ?, mas que também causa angústia, ansiedade, pânico e apatia nas audiências, o que pode resultar em uma diminuição ou até mesmo suspensão deste consumo por razões de saúde mental. (COBOS, 2021, p. 116).

Antes da pandemia, já se havia detectado como as audiências estavam consumindo notícias (tanto de meios tradicionais quanto de nativos digitais) principalmente através das redes sociais digitais, serviços de mensagens instantâneas e aplicativos de notícias, e que o faziam principalmente através dos seus telefones móveis (COMSCORE, 2019, p. 7,8), relegando para segundo plano as formas tradicionais (assistir ou ouvir noticiários, ler o jornal impresso…). No caso da Colômbia, em março de 2020, o governo nacional informou sobre o primeiro caso de covid-19, a ordem de quarentena e confinamento, estatísticas de infectados e falecidos, e outros atos relacionados, que levaram a um importante aumento do consumo de meios noticiosos. Segundo a Comscore (2020): 

Durante o mês de março de 2020, os sites de notícias e informação registraram um aumento médio de visualizações de página de 37%, onde os usuários observaram aproximadamente 6 milhões de páginas diárias a mais em comparação com o mês anterior. Por outro lado, em 2019, a percentagem de mudança entre fevereiro e março de 2019 foi de apenas 2%. 

Além disso, “85% do consumo de visualizações de página foi através de um dispositivo móvel”. Paralelamente, de acordo com Kantar IBOPE Media (EJE21, 2020), o consumo de televisão em 2020 foi mais alto que em 2019; em abril de 2020 os colombianos chegaram a assistir uma hora e três minutos a mais de televisão comparado com o mesmo mês de 2019, sendo os telejornais um dos gêneros televisivos mais assistidos, e os programas governamentais e de conteúdo sobre covid-19 aumentaram durante os primeiros meses da pandemia em 300%. Na mesma direção, Cobos (2021, p. 124) afirma que o confinamento durante esses primeiros meses de pandemia ? abril e maio de 2020 ? implicou passar mais tempo em casa e a necessidade de estar informado, levou a que o consumo de televisão tradicional (noticiários, programas de opinião…) tivesse um forte repique em índices de audiência, e que ela e a imprensa digital fossem os dois meios noticiosos mais consumidos pelas audiências colombianas nesse período. 

Esses consumos implicam um processo de avaliação que a audiência faz da frequência com que consomem notícias, de como elas impactam (emoções, decisões, comportamentos…), bem como a formação de um julgamento de valor ou opinião, de quem os emite, os meios de comunicação. Esse aspecto foi abordado por Masip et al. (2020) na Espanha, onde, entre outros aspectos, a percepção da cobertura informativa das audiências espanholas era que os meios estavam oferecendo informação demais, que as linhas ideológicas deles estavam condicionando o que se informava sobre isso e que havia tendência à espetacularização na cobertura que levava a gerar alarme social. 

No contexto do que foi exposto até agora, esta pesquisa propôs-se a explorar quais eram as percepções das audiências colombianas em quarentena durante os primeiros meses da pandemia em relação a como os meios de comunicação estavam informando no que diz respeito ao volume de produção, linha editorial e tratamento jornalístico. 

Metodologia

Este estudo faz parte da pesquisa matriz “Consumo de meios de comunicação durante a pandemia de covid-19 na Colômbia”, do centro de pesquisa Meios Massivos e Produtos Culturais da Universidade Tecnológica de Bolívar. A abordagem foi quantitativa e de escopo exploratório e descritivo devido à novidade do tema e à contingência gerada, bem como à urgência e premência em executar os primeiros diagnósticos de como a covid-19 estava impactando o ecossistema de notícias colombiano sob diversas perspectivas, entre elas as percepções das audiências sobre como os meios de comunicação estavam atuando. 

Para tal fim, foi aplicado um questionário de 34 perguntas que coletou informações sobre dados sociodemográficos, necessidade de informação, hábitos de consumo de notícias, credibilidade e confiança nos meios de comunicação, assinaturas, gestão de desinformação e memes. O questionário original foi desenhado pelo Digilab: Media, Strategy and Regulation[1] da Universidade Ramon Llull (Espanha), que foi adaptado ao contexto colombiano, alterando expressões espanholas por expressões colombianas, garantindo não alterar o sentido, para facilitar a compreensão do questionário, bem como a modificação de algumas opções de resposta de acordo com a realidade colombiana. 

O formulário foi hospedado no Microsoft Forms e esteve aberto para respostas do dia 4 de abril até o dia 14 de maio de 2020, ou seja, entre uma semana após o início do isolamento social obrigatório ou quarentena no país e poucos dias após sua terceira prorrogação, sendo, portanto, uma conformação por conveniência da amostra. Para sua divulgação, optou-se por distribuí-lo através do Facebook, Twitter, WhatsApp e e-mail com a intenção de alcançar a participação das cinco regiões geográficas do país, incluindo aquelas com conectividade muito baixa. De acordo com o BBVA Research (2019), na Colômbia, estima-se que haja 29 milhões de usuários de internet; os serviços mais utilizados são o Facebook e o Whatsapp, com mais de 18 milhões de usuários, seguidos pelo YouTube com 9,9 milhões, Instagram com 7 milhões e Twitter com 4,1 milhões, e existe uma alta desigualdade no acesso à internet de acordo com o nível de renda e área de localização. 

O questionário considerou diversas opções de respostas: seleção única, múltipla escolha, escala de Likert e, em alguns casos, a opção “outros”. No final, havia uma pergunta aberta onde o entrevistado ou entrevistada poderia fornecer informações adicionais, se desejado. Todas as perguntas eram de resposta obrigatória, exceto a última, a pergunta aberta, que era opcional. Os dados das 2.084 respostas válidas obtidas foram exportados para o Microsoft Excel para análise. Como limitações, a amostra foi composta apenas por pessoas que tinham acesso à internet e que foram contatadas por uma das plataformas mencionadas, ficando de fora, portanto, aqueles que não atendiam a tais condições. Além disso, embora tenha sido feito um grande esforço para obter respostas de pessoas residentes em estados do país com conectividade muito escassa, a quantidade de respostas coletadas foi muito baixa. No entanto, fica a satisfação de que nenhum estado colombiano ficou sem representação. 

Descobertas

Conforme indicado, foi recebido um total de 2.084 respostas válidas de pessoas com acesso à internet e residentes em uma das cinco regiões geográficas da Colômbia, distribuídas da seguinte maneira:

Tabela 1.Composição da amostra. Ver no pdf.

A Tabela 1 mostra que 51,1% dos participantes são mulheres e 48,8% são homens, uma amostra quase equilibrada, com uma idade predominante entre 45 e 54 anos (27,5%) e 35 a 44 anos (23,9%). A maioria dos participantes está na região Andina (44,3%) e na Costa Atlântica (31,5%). Os estados com a participação mais baixa (entre 2 e 17 pessoas) são aqueles com baixa conectividade à internet, enquanto os estados com alta participação (em particular os de três dígitos) são os que têm alta conectividade e onde estão localizadas as principais cidades do país: Bogotá (Cundinamarca), Medellín (Antioquia), Cali (Valle del Cauca), Barranquilla (Atlántico) e Cartagena de Indias (Bolívar). Esses dados coincidem com os resultados do censo do DANE (2018) sobre o acesso à internet no país. 

Como antecedente, Lozano et al. (2024) encontraram que 60% dos entrevistados manifestaram uma necessidade constante de estar informados sobre a evolução da pandemia. Além disso, 70,1% dos participantes aumentaram sua frequência de consumo de notícias depois que foi declarado o estado de pandemia na Colômbia e a subsequente quarentena. 

Esse aumento na demanda por informação pode ser atribuído à novidade e proximidade do tema, bem como à significativa ameaça ou risco que representava para a saúde da população e que, por sua vez, motivava a constante geração de notícias relacionadas com o mesmo. (LOZANO et al., 2024, p. 93).

Subsequentemente, foi perguntado a esses participantes sua percepção ou opinião acerca de como os meios de comunicação estavam realizando seu trabalho informativo com respeito à quantidade de informação fornecida ou volume de produção:

Tabela 2. Percepção sobre o volume de produção. Ver no pdf.

Como se observa na Tabela 2, 35,7% do público entrevistado, com mais ênfase nos homens, concordou que os meios de comunicação estavam fornecendo informações demais sobre a pandemia de covid-19. Em contrapartida, 21% expressaram uma posição neutra e 16,3% discordaram. Nos comentários adicionais, alguns entrevistados reiteraram que havia muita, demasiada, excessiva, repetida, exagerada superexposição ou sobressaturação de informação sobre o tema. No entanto, outros sugeriram que informações estavam sendo ocultadas e que havia coisas que não estavam sendo contadas ou estavam incompletas. Alguns perceberam, inclusive, que tal excesso poderia estar sendo usado como cortina de fumaça, ou desvio de atenção, uma vez que temas como a corrupção política (como a compra de votos e outras) haviam deixado de aparecer na agenda midiática. Diante do que percebiam como excesso, alguns manifestaram ter experimentado cansaço, estresse, sobrecarga, medo, nervosismo, pânico, ansiedade, angústia, temor, inquietude e incerteza. Por conseguinte, optaram por não consumir mais notícias sobre o tema em nenhum meio de comunicação. 

Na pergunta seguinte, pediu-se aos entrevistados que avaliassem se consideravam que os meios de comunicação estavam condicionados pela sua ideologia ao informar sobre a pandemia de covid-19:

Tabela 3. Percepção sobre condicionamento ideológico. Ver no pdf.

Na Tabela 3, observa-se que 38,6% da amostra entrevistada manifesta concordar e 31,3% concorda totalmente. Em uma análise por gênero, 42,1% das mulheres expressaram seu acordo e 38% dos homens concordaram totalmente. Nos comentários adicionais, alguns manifestaram perceber uma cobertura muito tendenciosa, manipulada, distorcida ou armada de acordo com os interesses do meio, com alta recorrência a fontes oficiais (do Estado) ou a serviço do governo (“parecem informativos da presidência” ou “informam o que o governo quer”). 

Por fim, perguntou-se aos entrevistados a sua percepção sobre o tratamento jornalístico, ou seja, se consideravam que os meios de comunicação estavam informando corretamente ou se estavam tratando de forma sensacionalista a informação sobre a pandemia de covid-19: 

Tabela 4. Percepção sobre cobertura correta. Ver no pdf.

Tabela 5. Percepção sobre sensacionalismo e alarmismo na cobertura. Ver no pdf.

Conforme observado na Tabela 4, 30,9% dos entrevistados manifestaram discordar que os meios de comunicação estavam informando corretamente sobre a pandemia de covid-19. No entanto, um número ligeiramente maior, 31%, escolheu a opção neutra, indicando incerteza ou falta de conhecimento sobre a questão. Essas posições foram as mesmas em ambos os sexos. Posteriormente, perguntou-se se consideravam que os meios estavam tratando o tema de forma sensacionalista e gerando alarme social desnecessário (Tabela 5). Um total de 29,7% dos entrevistados, mais homens do que mulheres, concordaram com a afirmação, enquanto 25,2%, mais mulheres do que homens, não souberam responder ou não tinham certeza. Em outras palavras, existia a percepção, embora não dominante, de que os meios de comunicação não estavam cobrindo o tema corretamente e estavam sendo sensacionalistas. Nessa direção, alguns dos comentários adicionais, particularmente referindo-se à televisão, mencionavam, por exemplo, ênfase em estatísticas de infectados e falecidos em vez de tratar dos recuperados, escassez de informação científica (por exemplo: avanços sobre as pesquisas em vacinas, entrevistas com cientistas etc.), poucas notícias positivas e amigáveis, aumento do tempo de duração dos telejornais para falar apenas do vírus, informação imprecisa ou incorreta, sensacionalismo, informação insuficiente sobre autocuidado (como o uso de álcool em gel, luvas, máscaras), repetição incessante de informações e desinformação que provocava caos. 

Considerações finais

Como foi possível observar neste estudo, evidenciou-se que as audiências colombianas, entrevistadas durante os primeiros períodos da quarentena – ou isolamento preventivo obrigatório – no país, tiveram a percepção de que houve uma superprodução de notícias sobre a pandemia de covid-19 (53,1% concordaram e totalmente de acordo), o que levou a uma superexposição ao tema que, por sua vez, causou impactos na saúde mental e, consequentemente, levou alguns a diminuir ou cancelar o consumo de notícias, principalmente televisivas, como observado nos comentários adicionais. Isso corrobora o que foi proposto por Wright (1960 in DE MORAGAS, 1986, p. 77) sobre as disfunções da comunicação de massa, tais como o excesso de notícias negativas que pode gerar pânico na audiência. 

Além disso, houve a percepção de que as coberturas feitas pelos meios de comunicação estavam condicionadas pela sua linha editorial (70% concordaram e totalmente de acordo) e que, como observado nos comentários adicionais, pareciam atuar como porta-vozes do governo. Da mesma forma, prevaleceu a percepção de que os meios de comunicação não estavam fazendo uma cobertura correta sobre o tema (47%). Por fim, as audiências entrevistadas percebiam que o tema da pandemia de covid-19 estava sendo tratado de forma sensacionalista pelos meios e gerando alarme social desnecessário (48,5% concordaram e totalmente de acordo). Esses dois últimos aspectos são matizados nos comentários adicionais. Alguns entrevistados diferenciavam entre os meios de comunicação nacionais e estrangeiros, mencionando que preferiam estes últimos para se informar. Outros só se informavam a partir de meios nacionais específicos, enquanto questionavam fortemente a outros, o que reflete o grau de confiança e credibilidade depositados nestes (COBOS, 2021). 

Nas respostas dadas, em alguns momentos determinada opção tinha maior predominância em um sexo do que no outro. Como exemplo, 42,1% das mulheres sobre 35% dos homens concordavam que os meios estavam condicionados pela sua linha ideológica ao informar, ou 37,8% dos homens sobre 33,8% das mulheres concordavam que, em geral, os meios estavam fornecendo muita informação sobre a pandemia de covid-19. 

Para concluir, essas descobertas nos convidam a refletir sobre a responsabilidade social dos meios de comunicação, especialmente em situações de crise de saúde pública mundial. Como vimos neste estudo, as audiências colombianas entrevistadas não consideram que os meios estejam cumprindo com a sua responsabilidade social. 

Notas de rodapé:

[1] A autora agradece a Pere Masip, PhD, que, como diretor deste centro, permitiu o acesso ao referido questionário. Descanse em paz.

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